Entrevista: Vice-Reitor da ULisboa, Dr. João Peixoto
Numa fase de decisões, dúvidas, análise de hipóteses e de transição, toda a informação é pouca. Se estás a concluir a tua licenciatura e a pensar qual é o passo mais acertado para dar a seguir, sabe que não há uma única resposta válida e que há vários fatores que deves ter em conta. Quais? Sobre isso conversámos com o Vice-Reitor da Universidade de Lisboa, o Dr. João Peixoto.
Não percas uma linha desta conversa e boas escolhas!
Para um jovem que termine a sua licenciatura, que opções académicas lhe oferece a Universidade de Lisboa?
Se eu tivesse só uma palavra diria “Todas”. O difícil, no nosso caso, é escolher. A quantidade de diplomas de mestrados, doutoramentos e pós-graduações, não conferentes de grau académico é cada vez maior na Universidade de Lisboa.
Quem termina a sua licenciatura depara-se, muitas vezes, com a questão: “Terei retorno em continuar a investir nos estudos ou devo avançar para o mercado de trabalho e perceber as minhas necessidades reais e as do mercado?”. Como podemos responder a esta dúvida?
No nosso país, a formação académica está concentrada, principalmente, em idades jovens e estas, optam por completar a sua formação de forma contínua, começando pela licenciatura, seguindo para o mestrado – que tem cada vez mais alunos inscritos – e terminando no doutoramento, para onde menos alunos seguem. Do nosso ponto de vista, isto são ótimas notícias, significa que estamos a formar cada vez mais jovens e a aumentar cada vez mais a qualificação de cidadãos em Portugal. Para os jovens, isto também são ótimas notícias!
Está comprovado por todos os estudos realizados em Portugal e no estrangeiro que, quanto maior é o investimento na formação, maior é o retorno a curto, médio e longo prazo.
As Pós-Graduações tem tido uma crescente procura entre os estudantes e ex-alunos. Na sua opinião, a que se deve esta crescente procura?
(…) O último estudo da OCDE, publicado em 2022 sobre os mestrados, indica-nos que os alunos de mestrado, em Portugal, são dos mais jovens da Europa, precisamente, porque a tendência em Portugal é haver uma formação contínua, sem interrupções. Enquanto, em muitos países europeus, o que acontece é que as pessoas cumprem o 1.º ciclo de estudos, entram no mercado de trabalho, onde permanecem algum tempo e só depois avançam para o mestrado. Isto tem algumas vantagens, as pessoas entram nesta fase mais maduras, mais conscientes das suas inclinações e preferências pessoais e profissionais e têm uma outra perceção da realidade, o que acaba por enriquecer também o ensino. Os nossos mestrados, fruto desta tendência portuguesa, acabam por ser, em certa medida, uma licenciatura avançada, digamos assim, direcionados para um público muito jovem.
Sabemos que em Portugal, não é fácil entrar e sair do mercado de trabalho, mas como é que estamos a tentar resolver esta questão? Falo em nome da Universidade de Lisboa, mas isto é uma tendência nas universidades portuguesas, estamos a reunir esforços para investir em formação não conferente de grau, isto é, pós-graduações com a duração de semanas, meses, um semestre e em raros casos, um ano. Lançámos em 2022, uma Escola de Pós-Graduação da Universidade de Lisboa, a nossa mais recente inovação ao nível do ensino. Esta é uma Escola que não é física, mas reúne a oferta de formação não conferente de grau de todas as nossas escolas. Antes esta formação estava dispersa por todos os estabelecimentos e agora está mais coesa, tem mais sinergias. (…) O ano passado já tivemos milhares de alunos inscritos e o nosso objetivo, a curto prazo, é ter 10 mil alunos inscritos, precisamente porque sentimos que o que interessa a quem entra no mercado de trabalho, não é o título de mestre ou doutorado, mas sim, deter conhecimento que seja útil para desafios concretos na sua profissão e esse conhecimento, muitas vezes, aprende-se em poucas semanas ou poucos meses. Esta é, portanto, a nossa maior aposta atual, investir na formação ao longo da vida.
“Os três anos de formação diria que são escassos atualmente, contudo, para algumas áreas do saber são mais do que suficientes para serem competitivos no mercado, mas, apesar de tudo, estas áreas são uma minoria.“
Tendo em conta a necessidade do mercado de trabalho em deter profissionais que invistam na formação ao longo da vida e no crescente número de jovens a investir em mestrado, na sua opinião compensa, atualmente, investir numa formação mais curta e prática como as pós-graduações, ou numa formação académica mais longa como os mestrados?
A Universidade de Lisboa não tem nenhuma posição oficial sobre este assunto, contudo, posso deixar a minha opinião baseada na minha experiência. Penso que dependerá muito das circunstâncias das profissões e formações. Há casos de jovens que completaram a sua licenciatura e entraram diretamente para o mercado de trabalho, sem passar pelo mestrado e tiveram carreiras extraordinárias, mas também conheço casos de jovens que ainda bem que investiram no mestrado, logo a seguir à licenciatura, porque assim conseguiram ter carreiras extraordinárias.
Se eu tivesse de fazer uma sugestão mais direta, diria que prosseguir para os cinco anos de formação, atualmente, é uma aposta acertada. Os três anos de formação diria que são escassos atualmente, contudo, para algumas áreas do saber são mais do que suficientes para serem competitivos no mercado, mas, apesar de tudo, estas áreas são uma minoria. Os cinco anos são uma aposta mais sólida, atualmente, até porque permitem enriquecer o portfólio de competências que deve ser cada vez mais variado. Mas tudo isto depende da área do saber em questão, dos interesses e ambições de cada pessoa. A vantagem de agora as licenciaturas terem três anos e os mestrados dois, é que ao fim dos primeiros três anos podem ser feitas algumas reconversões e enriquecimentos. No fundo, a má notícia é que é difícil escolher, a boa notícia é que é possível escolher.
Fazer uma interrupção, à semelhança do que acontece em muitos países europeus, entre o 1º e o 2º ciclo de estudos para experimentar o mercado de trabalho, desenvolver competências práticas e aprofundar conhecimentos técnicos pode ser uma vantagem, até académica, para os jovens?
Eu diria que sim, mas não é muito aconselhável experimentar. Passo a explicar a minha ideia: os países onde é mais típico as pessoas fazerem esse trajeto interrompido entre licenciatura, mercado de trabalho, mestrado ou outra formação académica e regresso ao mercado são países com pouco desemprego jovem, onde é fácil entrar e sair do mercado. Em Portugal não é fácil, o desemprego jovem é significativo, os contratos precários são uma realidade alargada, construir uma carreira evolutiva é um desafio… por isso, eu diria que é bom não experimentarmos isto. Se a pessoa encontrar trabalho com condições satisfatórias e com boas perspetivas futuras, deixe-se ficar e mais à frente invista em formações. Muitos estudantes de mestrado são estudantes trabalhadores, mas não é o ideal, naturalmente que há muitas pessoas que entraram no mercado, não podem abdicar do seu rendimento, nem podem reduzir o número de horas.
No caso dos doutoramentos, o crescimento foi também bastante expressivo, mas sabemos que este nível de formação não tem a mesma procura de níveis mais baixos. A quem se dirige este 3º ciclo de estudos?
Existem doutoramentos em todas as áreas de investigação. Mas, quem deve prosseguir estudos de doutoramento? Isso depende dos objetivos, interesses e qualidades de cada pessoa. Os doutoramentos são exigentes, são trabalhos de investigação que pressupõem produzir um conhecimento novo e essa é a diferença essencial entre o 3º ciclo e os restantes, em que, nestes últimos, se ensina e se aprende o que já se sabe, não há a produção de um novo conhecimento, mas a aquisição do que já existe. Apenas a tese de mestrado pode contemplar uma pequena novidade ao nível do conhecimento, mas nada de significativo. Esta é a diferença essencial.
Por definição, o doutoramento é a produção de um conhecimento original que implica testes, experiências, confrontação de hipóteses, auscultação dos pares, idas a conferências… são normalmente três anos de duração, por isso, as qualidades das pessoas são importantes, nem toda a gente tem vontade de investir nesta formação e nem sempre se justifica ou é necessário.
Então, para que é que o doutoramento serve se nem sempre é necessário? Um doutorado tem um diploma de investigador, sabe investigar e produzir conhecimento novo e isto serve, naturalmente, para quem quer prosseguir a carreira de investigação, mas também para quem quer trabalhar na área da inovação e desenvolvimento nas empresas, nos espaços da sociedade civil. Neste ponto, estamos ainda um pouco distanciados da média europeia.
A grande maioria dos nossos doutorados permanece a trabalhar na sua instituição de ensino ou noutra. Há um número bastante significativo de jovens com um enorme talento e capacidade, mas que não têm uma carreira sólida na área da investigação e inovação, porque não há capacidade para remunerá-los devidamente. Portugal não tem ainda capacidade financeira para absorver o número de doutorados que vai sendo produzido. Os jovens doutorados têm cada vez mais vontade de ir para as empresas e desenvolver investigação, mas tem de haver uma correspondência do lado da sociedade civil, é preciso que também se valorize estas competências e que se queiram acolher nas organizações pessoas com este perfil. Há, naturalmente, áreas em que é mais necessário ou até fundamental ter este tipo de profissionais, como por exemplo, a indústria farmacêutica.
Por outro lado, se as empresas quiserem apostar na inovação e não na reprodução, como por exemplo, na indústria automóvel, temos de ter pessoas com capacidade para inovar e criar produtos ou serviços novos e isto não é uma ambição ou uma necessidade de todas as áreas ou empresas. Mas há a necessidade de fazer também esta aposta, se queremos ter um mercado competitivo
Para um jovem sem experiência profissional, é um choque de realidade terminar os estudos e ingressar no mercado de trabalho. Como é que a ULisboa apoia os estudantes nesta transição?
Temos gabinetes de empregabilidade e feiras profissionais que permitem ao aluno ter algum contacto com o mercado de trabalho, antes de entrar no mesmo. Mas toda a gente sabe um bocadinho do que se passa no mercado de trabalho, porque toda a gente conhece quem trabalhe em empresas e isso permite-nos conhecer um pouco deste mercado. As universidades têm já estruturas de mediação no mercado de trabalho que permitem alguma preparação para este ingresso. Por outro lado, esta transição é um choque inevitável, é uma mudança de vida. As pessoas devem estar sempre preparadas para entrar no mercado de trabalho e quem está no mercado deve estar preparado para regressar à Universidade.
Relativamente ao próximo ano letivo, como prevê que este será em termos de número de candidatos, áreas com maior e menor procura? Há algumas mudanças previstas?
Existe, como é do conhecimento público, uma reforma no que diz respeito ao acesso ao ensino superior, mas para a maioria dos estudantes que entra pelo sistema nacional de acesso, o sistema mantém-se semelhante aos anteriores anos letivos. Esta é a fase para os estudantes pensarem nas possibilidades disponíveis, para irem a feiras ver as ofertas formativas, consultarem os sites das várias faculdades e verem as opções disponíveis para o ano letivo em questão, falarem com pessoas, sejam elas alunos, ex-alunos, professores que conheçam e que visitem pessoalmente as próprias faculdades, com o intuito de fazerem boas escolhas no futuro. No que diz respeito à Universidade de Lisboa, a oferta formativa não vai sofrer alterações significativas, a nível do 1º ciclo é muito constante, por sua vez, os mestrados e doutoramentos são mais variados. Relativamente à pós-graduação não conferente de grau é bastante mais variada, a novidade é constante. O que interessa é que façam escolhas conscientes, acertadas e que sejam felizes!