Um estudo conduzido por investigadores do Centro Interdisciplinar de Investigação Aplicada em Saúde do Instituto Politécnico de Setúbal (CiiAS-IPS) permitiu testar, com resultados muito positivos, os efeitos de um tratamento de fisioterapia em pessoas com fibromialgia, assente na prática de exercício físico específico em conjugação com sessões educativas em grupo para a autogestão desta doença.
A investigação, que teve início em janeiro de 2020, integra o projeto SHARE – Saúde e Humanidades Atuando em Rede, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), tendo-se prolongado até abril de 2021, envolvendo um total de 96 voluntários com diagnóstico de fibromialgia.
“A capacidade de autogestão das condições clínicas de natureza crónica, como é o caso da fibromialgia, é atualmente um aspeto central na prestação decuidados de saúde informados pela evidência científica e centrados nas pessoas”, lembra a investigadora responsável, Carmen Caeiro, explicando a premissa em que se baseou este estudo, que passou por duas fases.
Num primeiro momento foi realizado um ensaio controlado aleatorizado, através do qual se pretendeu investigar os efeitos de um tratamento baseado em sessões de exercício físico e educação para a autogestão da fibromialgia (grupo experimental), comparativamente com os efeitos de um tratamento que incluiu apenas sessões de exercício físico (grupo de controlo). Posteriormente, foi efetuado um estudo qualitativo para aferir o contributo das sessões educativas, em particular para a capacidade de autogestão da condição clínica, com recurso a grupos focais para os quais foram convidados os participantes que haviam frequentado o grupo experimental, na primeira fase do estudo.
Numa análise preliminar, o que se pode concluir é que, “em ambos os grupos, os resultados foram estaticamente significativos e clinicamente relevantes nas variáveis em estudo, o que significa que os participantes obtiveram melhorias, por exemplo ao nível da dor ou da sua capacidade funcional, que resultaram do tratamento implementado”, informa a investigadora, sublinhando que “não se verificaram, até ao momento, diferenças significativas entre os grupos”.
No que toca à componente qualitativa do estudo, “verificámos que as sessões educativas contribuíram, na perceção dos participantes, para a sua capacidade de gerir a doença”, ao promoverem, por exemplo, uma aprendizagem sobre os fatores que influenciam a perceção da dor, a validação da experiência de viver com fibromialgia, “o que assume especial relevância num contexto de alguma descredibilização social da doença”, a reinterpretação da dor e da doença e também “o empoderamento para, de facto, gerir a doença no seu dia-a-dia”, adianta a docente da Escola Superior de Saúde (ESS/IPS).
O estudo efetuado e que sofreu um atraso na sua conclusão, em virtude da suspensão por seis meses dos tratamentos presenciais, dado o contexto pandémico, permitiu também realçar algumas caraterísticas da abordagem clínica que, na perceção dos participantes, foram determinantes no sucesso do tratamento. São exemplos disso o “envolvimento ativo dos participantes nas sessões educativas, através da partilha das suas narrativas clínicas”, bem como o perfil do fisioterapeuta, “sendo a capacidade de personalização do tratamento e motivação para a realização de exercício físico os aspetos mais valorizados”, adianta Carmen Caeiro.
A fibromialgia é uma síndrome que afeta perto de 200 mil pessoas em Portugal e que apresenta como principais sintomas a dor generalizada e a fadiga, sendo que, frequentemente, numa primeira linha, é tratada com recurso a fármacos, sem que previamente se explorem os potenciais benefícios das abordagens não farmacológicas.
Liderado pelo IPS, o estudo teve como parceiros a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, enquanto instituição proponente do projeto SHARE, a MYOS – Associação Nacional Contra a Fibromialgia e Síndrome de Fadiga Crónica, os centros hospitalares de Setúbal (Unidade Multidisciplinar de Terapêutica da Dor) e de Lisboa Ocidental (Serviço de Reumatologia do Hospital Egas Moniz) e o CEDOC – Centro de Estudos de Doenças Crónicas, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de Lisboa.
Estiveram envolvidos na aplicação do estudo uma fisioterapeuta bolseira de investigação, quatro estudantes do mestrado em Fisioterapia em Condições Músculo-Esqueléticas e três estudantes da licenciatura em Fisioterapia.