Com o inglês posto para trás das costas, David Fonseca apresenta-nos o seu Futuro Eu. Chama-me Que Eu Vou é o nome de uma das canções, e podia muito bem representar o que lhe aconteceu: o Português chamou-o, e ele foi.
Acaba de sair o primeiro álbum totalmente em português do David Fonseca, com o nome Futuro Eu. Isto é uma declaração de interesses para o que aí vem?
Para já, tenho de constatar que não deixa de ser incrível como, ao longo destes anos, me tem sido apontado o facto de cantar sempre em inglês, e agora que canto em português também têm alguma coisa a dizer… Eu acho que cantar agora em português acontece por várias razões, desde logo por no ano passado ter feito aqueles concertos com os Silence 4, e com o facto de normalmente não me sentir confortável com uma certa repetição de coisas que já fiz antes.
Nessa altura, entre ensaios, pegava no meu carro e ia até à casa da minha avó, uma casa em Peniche, isolada de tudo, à procura de qualquer coisa diferente de tudo aquilo que estava a fazer. Eu não sabia bem o que é que isso ia ser, mas o que é facto é que, passados alguns dias, surgiram os primeiros versos em português, até se transformarem numa música. Achei que seria boa ideia apostar nisso, entusiasmei-me e acabei por fazer o álbum inteiro na nossa língua. Mas não foi nada pensado, nem sei se passará por aí o meu futuro, e acho que aí é que reside boa parte do encanto de estar na minha posição.
“É mais fácil de escrever em português, mas é um pouco mais complexo de cantar, e nesse sentido houve algumas coisas que tive de mudar, e isso talvez tenha sido uma das coisas que mais me agradou. Acho que a única coisa que permaneceu inalterada foi mesmo o tema.”
Isso muda alguma coisa no processo de composição? Há outro tipo de cuidados a ter?
Mudam algumas coisas. Eu acho que é mais fácil de escrever em português, mas é um pouco mais complexo de cantar, e nesse sentido houve algumas coisas que tive de mudar, e isso talvez tenha sido uma das coisas que mais me agradou. Para conseguir fazer este disco, tive de aprender e procurar coisas que eu nunca tinha feito, e alterar vários princípios que antes funcionavam e agora não. E isto processa-se em todos os domínios: a métrica, a sonoridade, o que cantas, o que dizes… Acho que a única coisa que permaneceu inalterada foi mesmo o tema, uma vez que acho que falo mais ou menos das mesmas coisas neste disco do que falava nos outros. A forma como o abordo é que penso ser um pouco diferente.
E musicalmente? É o pop rock do David Fonseca a que estamos habituados?
Digamos que quem ouvir o disco vai sentir-se bem dentro do universo musical que tenho construído ao longo dos anos, e se calhar vai também deparar-se com algumas surpresas que não esperava. Acho que há músicas um pouco diferentes, e outras muito características daquilo que as pessoas estão habituadas a ouvir de mim. É uma boa mistura de ambos os mundos.
Resolveste promover este disco com uma estratégia digital inovadora: um reality show, um dia na tua vida. De onde surgiu a ideia e que públicos pretendes alcançar com isso?
A ideia surgiu como todas as ideias surgem, de uma conversa com as pessoas que trabalham comigo, onde estávamos a falar sobre como promover este disco. Uma das ideias passava por acompanhar o processo de criação do álbum, comigo fechado em casa, e na descrição do que poderia acontecer alguém disse que seria “quase como uma espécie de Big Brother” e foi aí que percebi que era tarde demais para voltar atrás. E assim criámos este formato muito semelhante a um reality show, transformado em algo que tem a ver comigo, isto é, em vez de fazer aquilo que o reality show manda, é ele que se adapta ao que eu faço. E assim foi: fechei-me no estúdio, a tocar as canções do meu disco, a falar com pessoas que convidei – como o Nuno Markl ou o Ricardo Araújo Pereira – e acabei por atingir um número de pessoas inacreditável (foram 50 mil a ver isto)! Foi surreal, foi uma forma diferente de promover um disco, e acho que surpreendeu as pessoas e prendeu-as àquilo. O maior exemplo disso foi, numa dada altura, ter acordado (sim porque eu dormi, comi e fiz tudo o que uma pessoa normal faz) e haver 200 ou 300 pessoas a ver-me dormir às 5h30 da manhã…
O álbum chama-se Futuro Eu mas tu fechaste-te num espaço que remete para o teu passado e para as tuas raízes. Isso também foi premeditado? O que significa?
Não tem nenhuma mensagem em especial. Aliás, eu não acho que a minha música tenha como principal objetivo passar uma mensagem concreta, espero simplesmente que as pessoas gostem de ouvir aquilo que faço, e que depois façam as suas interpretações. Em relação à escolha destes sítios, faço-o para me sentir suficientemente bem para poder explorar a minha criatividade. Eu já disse em algumas ocasiões que assemelho o processo de criação de um disco à descida a um poço, e para o conseguir fazer preciso de sentir um certo conforto emocional. E para isso, nada como estar num sítio o mais familiar possível.
Tens surpresas na manga para a digressão deste novo disco? Alguma coisa que queiras partilhar com os teus fãs mais novos?
Os espetáculos que já estamos a fazer são, em si mesmos, bastante diferentes do que já fizemos até aqui. Não vou divulgar nada, digo apenas que é algo de invulgar e convido toda a gente a aparecer para perceber do que estou a falar. Faz parte da forma como me vejo – não como um músico, mas sim como alguém que está em posição de fazer as coisas acontecer… a música é apenas a forma de o materializar.
[Entrevista: Tiago Belim]
[Fotos: Universal Music Portugal]