Opinião | Doação de gâmetas. A que clube pertences?
Decerto já ouviste falar em doação de óvulos ou esperma. De esperma é provável que já tenhas visto em séries humorísticas. Nelas aparecem jovens, muitas vezes constrangidos, à espera de entrar para uma sala onde, com a ajuda de vídeos ou revistas, se masturbam para um copo em troca de algum “pocket money”. Cá fora, a aguardar a amostra, costuma estar uma enfermeira ora obesa e mal-encarada ou loura, esbelta e sorridente…
E doação de óvulos? Raramente se vê e por isso é natural que te interrogues se é possível fazer-se e como se recolhem os óvulos – é pela vagina, com uma sonda e não há lugar a dor porque é feito com anestesia.
Mas o que te venho falar é sobre outros aspetos tão ou mais importantes do que a forma de colher óvulos e esperma. Ser dador de gâmetas deve ser um motivo de orgulho e não de vergonha ou estigma. Existe uma necessidade social de gâmetas, tanto como de sangue e medula. Pensa que estás a dar a maior dádiva possível – algo que não se fabrica e que é a única possibilidade para tantos casais que desejam ser pais. Se alguma vez te confrontasses com a infertilidade, não gostarias que te ajudassem também?
Mas tem em conta que ser dador de gâmetas não é o mesmo que ser dador de sangue ou medula óssea. Nem todos têm perfil psicológico para o serem, porque implica que consigas lidar de forma confortável com a ideia de ajudares a nascer crianças com o teu material genético e no entanto não os sentires como filhos.
Lá diz o ditado “pai e mãe é quem cria”, mas para esta decisão não deves ir pelo que diz o povo. És tu que verdadeiramente tens que valorizar a importância de criar uma criança mais do que a genética que a originou. Até porque ela não é só por si garantia de amor parental… Se acreditas nisto, então a doação não te trará riscos psicológicos, nem agora nem mais tarde quando tiveres os teus próprios filhos.
Muito se fala na dicotomia motivação altruísta ou motivação financeira. Há que desmontar este argumento falacioso. É verdade que no nosso país, como em tantos outros, existe uma compensação financeira com um valor fixo definido por lei e que se destina a compensar o tempo e eventuais custos associados ao processo. Mas pela minha longa experiência no Programa de doação da Ava Clinic, as motivações dos dadores são muito variadas: ajudar, fazer exames médicos, ter alguma informação sobre a sua fertilidade, precisar de dadores no futuro (no caso de mulheres lésbicas, por exemplo). A compensação é muitas vezes referida como um incentivo ou um PLUS.
Ser dador é como ser do Sporting ou Benfica. Uns são outros não. Não se impõem, não se contraria. Nesta questão, qual é o teu “clube”?
Procura e pede informação para ficares devidamente esclarecido e decidires se a doação de óvulos ou esperma é para ti. Se sentes que és capaz de o fazer, avança! Abraça este causa e divulga. Existem casais e mulheres à espera da tua dádiva.
Ana Oliveira Pereira
Psicóloga Clínica
Ava Clinic Lisboa