João Rodrigues é o Presidente da Federação Académica de Lisboa (FAL) e faz nesta entrevista à Mais Superior o balanço do mandato da atual direção, e explica o porquê de querer recandidatar-se, continuando a aproximar a FAL dos seus associados. A importância do associativismo e das federações académicas para os estudantes e a política educativa do Governo são outros dos temas abordados.
Porquê uma recandidatura à liderança da Federação Académica de Lisboa?
Por acreditar que o nosso contributo e trajeto a percorrer na FAL ainda não terminou. Que há espaço para inovar, para fazer mais e melhor, na mudança da Academia que estamos a implementar.
O que foi feito ao longo do primeiro mandato? Quais foram as principais vitórias?
Creio que foi um mandato bastante positivo. Recebemos um bom legado e uma estrutura em crescimento, que nos obrigou a procurar inovar o que ainda não tinha sido feito e fortalecer o que já estava feito ou projetado. E foi precisamente isso que fizemos. Destaco, a nível político, algumas medidas que foram tomadas a nível de ação social (regulamento de bolsas, passe sub-23, alojamento) ou a nível científico, com a regulamentação do emprego científico.
A nível cultural e recreativo, criámos de raiz o Festival Académico de Lisboa. Uma receção que esgotou, no centro da Academia de Lisboa, e que fez os estudantes ficarem mais próximos da cidade onde estudam. No Desporto, organizámos o Campeonato Nacional Universitário de Surf, em parceria com uma Associação federada, tendo este tipo de parcerias sido uma novidade no que à organização deste tipo de eventos diz respeito. Candidatámo-nos à organização das Jornadas Concentradas de Desporto Universitário, em parceria com outras estruturas, que vamos co-organizar em Lisboa. É algo, creio, de salutar, a organização deste tipo de eventos na nossa cidade.
Na responsabilidade social, colocámos os Campos de Férias FAL como uma realidade para crianças de bairros desfavorecidos e conseguimos apetrechar a nossa Academia Consciente no Bairro Padre Cruz. O Centro de Estudos da FAL passou a ser uma realidade, e estamos prestes a publicar mais um livro com a chancela FAL, O Livro Negro do Ensino Superior de Lisboa.
Acho que é por tudo isto, por todas estas vitórias, e um pouco mais, que crescemos neste mandato da forma como crescemos. De 10 associações federadas para 15, com mais duas a ja terem formalizado o pedido de adesão.
O que te propões fazer em 2018? Quais são os objetivos da tua equipa, caso sejam reeleitos?
Queremos consolidar o crescimento que temos tido ao longo dos últimos anos. A nível financeiro, patrimonial a nível de relação com quem nos legitima, os nossos associados. Queremos igualmente inovar ao nível da proximidade política com os estudantes. Queremos dar mecanismos para que os estudantes percebam que a política educativa é fulcral no seu quotidiano estudantil, e que a Cultura e a Ciência são um mecanismo de desenvolvimento ímpar para a sociedade. Queremos inovar a nível recreativo, sendo que a ideia passa claramente por manter e alargar o Festival Académico de Lisboa. O desporto é fulcral na relação com as nossas associações, daí apostarmos no desporto informal.
Por fim, queremos fazer obras no nosso espaço da Academia Consciente, para dar mais condições para que as crianças possam frequentar o espaço.
Fazem realmente a diferença as federações académicas? A força de representarem dezenas de associações de estudantes faz-se sentir de alguma forma?
Fazem. Nós somos a prova viva disso. Sem amarrarmos os associados, pelo contrário, dando instrumentos e trocando sinergias para que todos, em conjunto, cresçamos. Temos isso no Festival Académico, através da sua participação, ou no ENDA, onde parte das moções apresentadas enquanto FAL advém da sua base, das Assembleias de Estudantes das nossas Associações. É este o modelo associativo a nível federativo que acreditamos. Do papel de representação direta e da relação próxima, de cariz formativo. Não de imposição, controlo, ou diminuição dos nossos associados.
Costumamos dizer entre nós que “a FAL é o que os associados quiserem”. E é a maior verdade que temos no exercício democrático para o qual fomos eleitos.
O “garrote” ao país e, consequentemente, ao Ensino Superior, aliviou e o contexto é hoje mais positivo. No entanto, os agentes do mundo da educação e do Ensino Superior continuam a queixar-se de falta de investimento. O que falta, afinal, para que o Estado invista mais no setor?
Falta que se torne uma prioridade nossa, enquanto cidadãos e membros de uma sociedade plural. Enquanto a opinião pública não se sensibilizar para a importância que o Ensino Superior tem, dificilmente será uma prioridade governativa e o investimento/financiamento será revisto. Ora, tal só aconteceria se conseguíssemos demonstrar à opinião pública a mais-valia que o Ensino Superior traz a nível pessoal, a nível social e a nível económico. A pergunta tem de ser: O que é que o Ensino Superior pode ajudar a mudar o nosso país? Pois, acredito que a educação é o motor por detrás de qualquer crescimento. Basta olharmos para muitos dos países europeus e para as apostas que fizeram e fazem ao nível da educação e do Ensino Superior. Temos feito essa aposta, mas precisamos de mais. Precisamos para mudar e aumentar o financiamento para que a sociedade civil legitime a construção política. Para que isso aconteça temos de saber comunicar e explicar a todos os portugueses, mesmo àqueles a quem nunca foi dada a oportunidade de estudar, que os seus impostos e contribuições fiscais são importantes para dinamizar esta parte de responsabilidade do Estado, de domínio e de poder público. E nós estudantes, temos essa responsabilidade. Representar estudantes é também isto: Procurar a construção de uma comunicação mais acessível, onde se dinamize publicamente a importância que acreditamos que o Ensino Superior pode ter.
Pode, realisticamente, um país como Portugal caminhar para um Ensino Superior gratuito e inclusivo para todos os alunos de todos os estratos sociais?
Pode, claramente que pode. Quem diz que não pode, ou não olha para os números ou quer defender uma lógica no Ensino Superior de clientela. O que é legítimo, ainda que discorde profundamente. Pode, e essa prova está claramente espelhada nos modelos de financiamento que temos em outros países de dimensão semelhante à nossa, na Europa. Claro que estes custos de frequência não podem desaparecer do dia para a noite. Pela estabilidade do sistema e das nossas instituições. Agora urge, na opinião pública, termos uma discussão: queremos, ou não, um Ensino Superior público? O que temos atualmente não é público, não é privado, não é nada. Os estudantes e respetivas famílias criticam o modelo de finacianmento, o que pagam de propinas. Os Reitores e Presidentes dos Politécnicos queixam-se da falta de financiamento. O Governo, timidamente, vai admitindo que a realidade não é famosa. Ora, se temos lados antagónicos que concordam que o financiamento não é o adequado, parece-me que a problemática terá de passar pela sua revisão. Mas o desafio não está na própria revisão, está sim em convencermo-nos, enquanto portugueses, de que – para resolver os problemas do Ensino Superior e do seu cariz (ou falta dele) público – temos de priorizar o investimento nesta área. Os orçamentos não esticam, nem nascem de árvores. Se queremos que o Ensino Superior seja uma extensão pública do sistema educativo, então temos de assumir que há outras áreas que deverão ser menos prioritárias. É algo a decidirmos, e claro, que da parte da Federação Académica de Lisboa e caso seja reeleito, estaremos sempre disponíveis para colocar este tema na agenda pública e batalhar pela construção de uma conceção social de Ensino Superior de domínio público com fontes alargadas e diversas de financiamento.
Com o preço do arrendamento em Lisboa e no Porto a subir exponencialmente, como se resolve a questão da habitação dos estudantes?
Com alterações à lei do mercado de arrendamento, maior envolvimento e criação de programas de arrendamento estudantil por parte das autarquias, flexibilidade fiscal para quem arrenda a este tipo de utilizadores. São três dimensões concretas de análise. Paralelamente, o aumento de residências e apetrechamento das que existem. O Ensino Superior cresceu em termos de estudantes, mas as residências permanecem – salvo raras exceções – inalteradas. É por aqui que vamos basear a nossa pressão política, no que ao arrendamento diz respeito.
Cumpre o associativismo, na tua opinião, tudo o que lhe compete para fazer ouvir a voz dos estudantes?
Creio que não. Por acreditar que é uma obra inacabada. A representação estudantil é complexa em termos de proximidade, pela falta de entrosamento dos nossos colegas nas defesas dos seus direitos. Da nossa parte temos feito o que acreditamos ser possível para cumprir essa missão. Mas o possível de hoje, muitas vezes, era o impossível de ontem e queremos continuar e evoluir nos mecanismos de diálogo e de proximidade a quem justifica a existência desta entrevista, da minha recandidatura, da Federação Académica de Lisboa: Nós, estudantes.
[Foto: Federação Académica de Lisboa]